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Português influenciado por IA: como a linguagem muda no Brasil

No Brasil, a IA já deixou de ser apenas curiosidade tecnológica. Hoje, ela aparece no grupo da faculdade, no briefing do trabalho, no roteiro do vídeo e até naquela mensagem profissional porém simpática no WhatsApp. Por isso, resumos de aula, e-mails formais, apresentações em slides e posts em redes sociais passam, cada vez mais, por algum filtro de IA antes de chegar ao destino.

Além disso, os números ajudam a dimensionar esse movimento. Em 2024, 54% dos brasileiros declararam ter usado IA generativa, acima da média global de 48%, segundo pesquisa do Google com a Ipsos. Ao mesmo tempo, o país figura entre os maiores usuários do ChatGPT no mundo, respondendo por cerca de 5% do tráfego global. Em paralelo, levantamentos do CGI.br mostram que quase dois terços dos jovens brasileiros de 9 a 17 anos já usam IA generativa para estudar, criar conteúdo ou lidar com emoções.

Diante desse cenário, quando milhões de pessoas consultam o mesmo modelo para escrever, revisar ou melhorar textos, o efeito deixa de ser individual. Aos poucos, a linguagem cotidiana passa a refletir esse padrão.

Por que isso é importante

A linguagem não funciona apenas como forma. Ela organiza o pensamento, estrutura argumentos e permite expressar discordâncias e negociações de sentido. Por isso, quando estudantes usam IA para escrever trabalhos, ajustar o tom de e-mails ou preparar apresentações, parte desse processo cognitivo se desloca para o modelo.

No ambiente de trabalho, esse efeito também se amplia. Relatórios, propostas comerciais e comunicações internas começam a seguir estruturas muito semelhantes. As frases ficam mais neutras, o vocabulário mais seguro e o estilo mais previsível. Como resultado, o texto cumpre sua função, mas perde traços de identidade.

Pesquisas internacionais já indicaram que palavras recorrentes em respostas do ChatGPT passaram a aparecer com mais frequência em vídeos e podcasts após 2022. Esse dado sugere que o vocabulário da IA atravessou o limite do texto escrito e chegou à fala humana. No Brasil, essa influência encontra um contexto específico, no qual a leitura de longo fôlego já representa um desafio para parte dos estudantes e a escrita ainda funciona como barreira em ambientes acadêmicos e profissionais.

Quando textos com aparência de IA passam a ser associados à escrita correta e adequada, outros registros começam a perder espaço. Esse movimento afeta tanto a forma como estudantes se apresentam em processos seletivos quanto a maneira como empresas comunicam cultura e posicionamento.

O que está em jogo

Nesse ponto, surge o risco de uma homogeneização silenciosa da linguagem. Estudantes de regiões diferentes, com repertórios culturais distintos, tendem a produzir textos cada vez mais parecidos. Da mesma forma, equipes de áreas diversas acabam adotando um tom genérico, mesmo quando público, contexto e história são completamente diferentes.

Ao mesmo tempo, o Brasil sempre se destacou pela criatividade linguística. Música, internet e cultura popular mostram como regionalismos, gírias e variações de registro ajudam a construir identidade. No entanto, quando a IA vira filtro principal de profissionalismo, parte dessa riqueza se suaviza em nome de um padrão considerado mais correto, mas menos representativo.

Isso não significa que a IA empobreça automaticamente a expressão. O problema aparece quando o modelo deixa de apoiar o processo e passa a moldá-lo. Nesse cenário, o vocabulário que nasce da experiência, da leitura, do erro e da conversa real corre o risco de ser substituído por escolhas linguisticamente seguras, porém limitadas.

Como responder a esse desafio

A resposta passa por letramento, não por proibição. Na educação, vale trabalhar abertamente com textos produzidos com IA. Comparar versões, identificar padrões e discutir o que se perde quando o texto fica excessivamente polido ajuda a desenvolver consciência linguística. Assim, o uso deixa de ser visto como fraude e passa a ser material de análise.

No trabalho, equipes podem usar IA para tarefas mecânicas, como rascunhar, resumir ou organizar ideias. No entanto, precisam incluir uma etapa clara de devolução de identidade. Isso envolve inserir termos do setor, exemplos locais, referências culturais e modos de falar que não surgem naturalmente em modelos treinados com dados globais.

Nas interações sociais, o ponto central é perceber quando a resposta sai no piloto automático. Em situações que exigem vínculo, confiança ou escuta real, muitas vezes o melhor texto é justamente aquele que não parece ter sido escrito por uma IA.

O que você precisa saber
  • O Brasil está entre os países que mais usam IA generativa no mundo, com mais da metade da população já tendo utilizado esse tipo de tecnologia.

  • O país responde por cerca de 5% do tráfego global do ChatGPT e figura entre seus maiores usuários.

  • Jovens brasileiros incorporaram a IA à rotina de estudo, criação de conteúdo e expressão emocional.

  • Esse uso em larga escala faz com que padrões linguísticos da IA influenciem textos acadêmicos, profissionais e sociais.

  • O desafio está em usar IA como apoio, mantendo repertório próprio, variação linguística e construção de voz individual e institucional.

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